Antigo primeiro-ministro declarou que Ministério Público quis esconder conduta
de Sérgio Monteiro no projeto do TGV.
José Sócrates decidiu, ontem, arrastar para a ‘Operação Marquês’ o nome de
Sérgio Monteiro, antigo secretário de Estado das Obras Públicas no Governo de
Pedro Passos Coelho, atualmente gestor do fundo de investimento Horizon.
Rebatendo a acusação de corrupção com o Grupo Lena no âmbito do projeto do TGV,
Sócrates optou, nas declarações prestadas em tribunal, por questionar o papel de
Sérgio Monteiro em todo o processo, acusando-o de um “evidente conflito de
interesses” que, na sua opinião, não foi valorizado pelo Ministério Público.
Segundo Sócrates, Sérgio Monteiro atuou, numa primeira fase, como representante
dos bancos e, já como secretário de Estado, negociou com estes a cedência para o
Estado (Parpública) do financiamento concedido ao consórcio Elos, que o Grupo
Lena integrava. “A acusação visou esconder esse facto e evidenciar outro. Atacar
o Governo anterior (PS) e proteger o Governo sucessor (PSD). “Ao mesmo tempo que
te acuso de corrupção com a Lena, escondo que Sérgio Monteiro fez isto”,
declarou o antigo primeiro-ministro. Refira-se que, em 2017, quando deduziu a
acusação, o MP extraiu uma certidão sobre Sérgio Monteiro, mas até hoje sem
qualquer resultado.
José Sócrates retomou, ontem, a prestação de declarações no julgamento da
‘Operação Marquês’. O antigo primeiro-ministro está acusado de uma dezena de
crimes, três são de corrupção passiva.
Procurador insiste no jantar
O procurador Rómulo Mateus insistiu, ontem, no tema que envolve um eventual
jantar entre José Sócrates e Ricardo Salgado, em 2015, na casa do antigo
banqueiro. O magistrado do Ministério Público voltou a pedir a reprodução de
escutas te- lefónicas, o que irritou o antigo primeiro-ministro.
“Querem saber se menti! Não menti! É ridículo isto! Estive lá meia hora! Em casa
de Ricardo Salgado. Depois fui a outra casa ali perto, naquela zona. De pessoas
que conheço. O doutor mora próximo de pessoas minhas conhecidas?”, disparou de
imediato Sócrates, que acabaria por ser confrontado com uma conversa mantida com
o seu antigo ministro Manuel Pinho a quem diz ter estado a jantar na casa do
“patrão” de Pinho. “Foi uma forma de falar, porque o jantar não aconteceu”,
respondeu Sócrates. “Até quando é que vão abusar da nossa paciência? O MP não
tem provas para apresentar?”, finalizou.
Juíza garante não ter “azedume” e convida Sócrates a pedir afastamento
A juíza-presidente do coletivo que está a julgar a ‘Operação Marquês’, Susana
Seca, convidou José Sócrates a apresentar um pedido de afastamento das juízas
(incidente de recusa) caso suspeite da sua imparcialidade. O aviso da magistrada
surgiu após o antigo primeiro-ministro ter-se queixado que o tribunal reagiu com
“azedume” às suas declarações. “Tem os meios processuais ao dispor para
apresentar os incidentes que entender e fundamentar como entender. O tribunal
não vai permitir é que faça essas considerações”, declarou Susana Seca.
PORMENORES
Contestação
O MP queria usar dados da geolocalização do telemóvel de Sócrates para
demonstrar que o arguido esteve sempre na casa de Ricardo Salgado. Paula
Lourenço, advogada de Carlos Santos Silva, interveio, dizendo que tais dados não
constavam do processo. A juíza travou as perguntas.
Motivação Política
José Sócrates não teve dúvidas ao declarar: “A motivação desta acusação foi
iminentemente política.” E mais: “Consciente ou inconscientemente, o Ministério
Público meteu-se ao lado da direita política.”
Cansaço
Ainda antes de a sessão de julgamento iniciar, José Sócrates fez questão de
pedir à funcionária judicial para transmitir à juíza-presidente, Susana Seca,
que nos outros dias de julgamento se sentiu muito cansado com as várias horas de
depoimento. Ao jornalistas, fez questão de dizer não ter sido um “queixinhas”.
E TAMBÉM
Crimes fora do País
A defesa do empresário Hélder Bataglia, empresário luso-angolano, acusado de
cinco crimes de branqueamento de capitais, apresentou um recurso no Tribunal da
Relação de Lisboa, alegando que os crimes que lhe são imputados ocorreram fora
do território nacional, logo os tribunais portugueses não têm competência para
os julgar.
Juíza determina
Para a juíza Susana Seca, José Sócrates pode afirmar que a acusação do
Ministério Público é “absurda”, mas não pode acusar procuradores de
“desonestidade”.
Defesa da honra
O procurador Rómulo Mateus saiu, ontem, em defesa dos seus colegas do MP que
fizeram a investigação, protestando pelas “sucessivas referências à sua
desonestidade” que José Sócrates foi fazendo ao longo das suas declarações.
“Estamos a discutir a pronúncia e essa desonestidade deve ser dirigida ao
Tribunal da Relação de Lisboa”, disse.